segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Passeio em Holambra

O calor escorria por minha pele seca
Onde muitas pessoas se aglomeravam
Contemplando as flores mais belas.

Ao redor, todo o tipo de gente,
Todos suados mas adoráveis e felizes.
Admirei a calma e a alegria esforçada,
Garantiram o bom sono da família
Naquele sábado de calor e cores.
As famílias partilhavam sorrisos e broncas
Que se dissipavam a cada canto florido.

Eu me admirava em fazer parte daquilo
Eu queria ser aquelas pessoas,
Suado, contente, lutando pelas pétalas
Lânguidas que caíam do céu
Sem medo de seu destino.

Capturei duas, envergonhado, desviando olhares.
Cruzei com aquele em mil tons de verde
Mais penetrantes que eu já havia visto.
Olhei desejoso, pensei em tudo o que queria.
Mas quantos pedidos eu deveria fazer?
Incerto da quantidade, mas decidido,
Fitei minha vontade naquelas pétalas,
Imaginei-me entregue ao meu futuro,
E pedi o mais óbvio que um homem
Preenchido de amor por uma mulher
Poderia sem escolha pedir.
Cravei meu olhar que diziam mil páginas
Camonianas de entregue amor
Naqueles olhos multiverdes.
Minha vergonha tombava,
Como nunca havia antes.
Orgulhoso agora,
Entreguei meu reino em vênia,
De espírito preenchido e
Sem medo do meu destino.

Em minha carteira guardei
Toda a fonte de minha bela sina.
Um pouco culpado por não achar melhor lugar.
Voltei com meus olhos tímidos
Aos meus pés pela força do mau hábito.
Porém minha vontade era a mais
Confiante e certa. Eu sabia
Exatamente o que eu queria.

Minha rainha, a bela matriarca
Iluminando mais que o sol que nos serenava,
Coloria o passeio com seus magistrais
Olhos de todas as cores.
Olhos verdes e castanhos, fitos nas flores.
Essas que contemplavam como eu
As covinhas daquele amável sorriso.
As flores foram testemunhas
Do evento mais solene que um coração pode partilhar.

domingo, 2 de setembro de 2012

TULIPAS VERMELHAS

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Pudessem as tulipas falar o que sinto,
Gesticularem dançando e emitindo
Odores agradáveis que remetessem
Ao início da história do meu amor por ela;

Ou ao menos a grandeza desse sentimento,
A paz de deitar em seu leito,
A alegria de todas as vezes que a encontro.

Ainda faltaria os apertos que sinto
No meu peito frágil e a saudade aflitiva
Que consome minha calma
Quando estamos longe um do outro.
                         
As pobres tulipas não conseguiriam expressar
A dor que sinto ao ver,
Dos olhos mais lindos que já vi,
Caírem lágrimas tão tenras
Que incerto e triste,
Ainda os julgo mais belos.

Apenas as tulipas saberão o quanto admiro amá-la,
O quanto amá-la eu admito.
Fiéis, não revelarão o valor desse sentimento
E sua real grandeza
Nem a fidelidade de senti-lo.
Estarão lá,
Apenas somando,
Colorindo,
Testemunhando.

Muitas flores ainda serão testemunhas.


           

           

sábado, 17 de dezembro de 2011

O que não se deve dizer
Não chegou nem a descer
Sobre a goela áspera;
Muito menos os alcoois
Serviram de lubrificante.
Justamente porque não desceu!
Não havia porque engolir,
Quando se pensa no mal
Que faz um alimento envenenado,
Enquanto já se encontra
Protegido pelos dentes.
E o cuspir é tão horrível,
E não menos danoso,
Que forçar a mandíbula fortemente
Para que se espremesse tudo junto;
Dentes na língua segurando veneno.
Quem sabe incorporaria
Às minhas glândulas
Essa minha vontade de peçonhento.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Doçura de Vida

A vida virou mais uma volta,
Uma andar abaixo,
Mas no mesmo ponto.
Aquela visão espiral descambou a pendular,
Embora eu me sinta tão apolínico.

Tomo de volta um reino
Que escapava por impulsos,
Pra não dizer vícios exagerados.
Mas já disse,
Exagerei.

Enxergo lirismo no canto das maritacas
E um desejo bem lá no fundo, mas ainda desejo
De comer melancia,
Minha grande inimiga.

O simples fato de uma novidade
Tão prosaica quanto café com pão;
E todo um entendimento de vida
Sem meus medos espectrais.

Quase tudo é novo
De chicletes a chocolates.
Existência sem estorvo,
E nossos belos debates.

Vejo agora, voltei aos vícios.
Bebi os goles amargos
Que por piores que fossem
Os sentimentos deixaram moles.

E hoje quero doces.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

O Descanso (estudo I)

Como os homens cansados de viver,
Ou simplesmente cansados,
Deitam-se os sentimentos
Em profundo hibernar.
A ordem se estabelece ao deitarmos,
Ao dormir
Ou morrer.
Merecemos descansar ao final de um longo dia
Ou angustiantes noites,
Insustentável existir.

Depois de longo amor
E grande odiar
Os homens hibernam exaustos
Buscando no além uma nova primavera.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Borboletas na barriga

Esse poema foi inspirado num quadro de uma amiga minha que me deixou perturbado, mas por um lado bonito. A inquietação dos homens que procuram algo sem nem saber o que. Há pistas que seguimos, rastros de algo que se esconde dentro de nós, mas não fazemos a menor idéia do que é, e procuramos, procuramos, procuramos.....

A ânsia do despertar


Fosse simples ansiedade
E estava tudo explicado.
Libertar-se de um peso,
Explorar um microcosmo bem aqui dentro;
Entender sua micro grandeza
E então dilatar os limites
Avoar torto e feioso, sem rumo.
Avoar com coragem;
Com esses membros frágeis
Delicados e coloridos;
Radiantes pétalas exploradoras
Tornam âmago em universo.

Fosse simples ansiedade,
Forçaria o tempo passar
Com as mais diversas futilidades.
Mas a angústia tem as matizes
Mais finas do que as que podemos perceber.
E dela todos temem com calafrios,
A ânsia do alívio ao voar;
O medo que intimida.
Arrepios de cócegas;
O flutuar das penas no ar.
As borboletas na barriga.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Poema de José Régio (1925)

Tomei a liberdade de pegar esse poema belíssimo.

Fado português

O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Ai, que lindeza tamanha,
meu chão, meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.

Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.

Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.


José Régio