Este blog, meus queridos, não salvará suas vidas. Vocês estão fadados à justiça da impiedosa morte. Enquanto isso aproveitem!
segunda-feira, 25 de outubro de 2010
Doçura de Vida
Uma andar abaixo,
Mas no mesmo ponto.
Aquela visão espiral descambou a pendular,
Embora eu me sinta tão apolínico.
Tomo de volta um reino
Que escapava por impulsos,
Pra não dizer vícios exagerados.
Mas já disse,
Exagerei.
Enxergo lirismo no canto das maritacas
E um desejo bem lá no fundo, mas ainda desejo
De comer melancia,
Minha grande inimiga.
O simples fato de uma novidade
Tão prosaica quanto café com pão;
E todo um entendimento de vida
Sem meus medos espectrais.
Quase tudo é novo
De chicletes a chocolates.
Existência sem estorvo,
E nossos belos debates.
Vejo agora, voltei aos vícios.
Bebi os goles amargos
Que por piores que fossem
Os sentimentos deixaram moles.
E hoje quero doces.
sexta-feira, 24 de setembro de 2010
O Descanso (estudo I)
Ou simplesmente cansados,
Deitam-se os sentimentos
Em profundo hibernar.
A ordem se estabelece ao deitarmos,
Ao dormir
Ou morrer.
Merecemos descansar ao final de um longo dia
Ou angustiantes noites,
Insustentável existir.
Depois de longo amor
E grande odiar
Os homens hibernam exaustos
Buscando no além uma nova primavera.
terça-feira, 21 de setembro de 2010
Borboletas na barriga
A ânsia do despertar
Fosse simples ansiedade
E estava tudo explicado.
Libertar-se de um peso,
Explorar um microcosmo bem aqui dentro;
Entender sua micro grandeza
E então dilatar os limites
Avoar torto e feioso, sem rumo.
Avoar com coragem;
Com esses membros frágeis
Delicados e coloridos;
Radiantes pétalas exploradoras
Tornam âmago em universo.
Fosse simples ansiedade,
Forçaria o tempo passar
Com as mais diversas futilidades.
Mas a angústia tem as matizes
Mais finas do que as que podemos perceber.
E dela todos temem com calafrios,
A ânsia do alívio ao voar;
O medo que intimida.
Arrepios de cócegas;
O flutuar das penas no ar.
As borboletas na barriga.
quarta-feira, 25 de agosto de 2010
Poema de José Régio (1925)
Fado português
O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.
Ai, que lindeza tamanha,
meu chão, meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.
Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.
Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.
Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.
José Régio
segunda-feira, 26 de julho de 2010
O DEMÔNIO DA MADRUGADA
Quando lembrei que estava me perdendo,
E que me arrependeria mais tarde
De tudo o que fazia,
De até ter nascido,
Querer ter morrido,
Buscado a palavra e o olhar,
Percebi que no fundo
Estamos mais só do que imaginamos.
Salvem-se meus caros.
Arrependam-se.
Admitam o erro da existência,
A solidão coletiva,
A asnice do amor.
Já lemos sobre tudo isso.
O que nos resta agora é errar?
E de novo?
terça-feira, 8 de junho de 2010
Vendo meu velho avô agonizar,
Por um pouco de ar.
Ele inspirava aos soluços,
Era tudo o que conseguia fazer.
Agonizei junto.
Tive que sair do seu lado,
E parar de chorar.
A asma me sufocava;
Eu suportava
Por um pouco de ar.
Meus soluços eram diferentes.
Queria que tudo acabasse logo.
E pensava se iriam me indagar:
“- Porque não fez nada?”
“- Você podia tê-lo intubado!”
Arrepiei de medo e culpa,
Mas ele ainda está aqui.
Respirando, tentando...
...
(8 horas depois)
...
Quando parei este poema
Foi para socorrê-lo...
Meu medo ficou mais forte.
Ele tentava respirar e sufocava.
Eu tremia e pude sentir a Morte.
Seus soluços eram esparsos;
Os meus de desespero.
Ambos tragávamos cada vez menos.
Chamei a enfermeira:
“- Ele não tem muito tempo.”
Quando contei 20 segundos
Entre um soluço e outro,
Ele deu mais um.
E eu sabia que seria seu último.
Um arfar seco e curto.
Era o fim.
Um calafrio correu-me pela espinha
E a tristeza da perda sufocou-me.
Não pude evitar o conflito.
A supremacia inevitável da morte,
Com sua justiça impiedosa;
E meu alívio em lágrimas.
O choro triste de impotência
O fim da dor e da angústia;
Minha, mas principalmente dele.
Meu avô me avisara;
Só não queria sofrer.
...
O Hospital Universitário
Será para sempre uma incógnita.
Foi estranhamente cômico
Com seus loucos e bêbados
Esbravejando frases sem nexo
E verdades não ditas,
Ou simplesmente triste.
A angustiante convivência
Da precária situação de nossos
Humildes concidadãos
E sua cansativa busca por saúde.
Muitas noites não dormidas.
Ajudando uns, consolando outros.
...
Tentarei ficar com a lembrança do velho
Que entrou ruim e saiu melhor,
Mas deixou lembranças e saudade.
Volte bem para sua terra,
Seja ela em Portugal,
Em Moçambique
Ou Brasil;
Onde me deste colo.
E os problemas nós relevamos,
Resolvemos em vida,
Pois a morte só nos remete a coisas boas,
À momentos bons e alegres,
Apesar da perda.
Morte é certeza.
Boa ida meu bom avô.
terça-feira, 11 de maio de 2010
Conformação III
Certa vez salvei uma vida.
Nunca cobrei a dádiva da segunda chance.
E, no entanto, me pergunto se preciso de uma.
Não sei se é chance ou nova existência.
O vazio me sufoca
Não perdi e nem ganhei.
Estou na mesma, porém só.
Perdi, então.
A verdade é o veneno
Da vingança do Conde de Monte Cristo.
Mata a longo prazo,
Havendo sempre um antídoto.
Eu apenas não o tenho,
Às vezes, nem sei se quero.
E naquelas horas, naqueles lugares,
Quando o vento sopra uma lembrança triste,
Quando o mar que não vejo me salga,
Sou um marco zero d’alguma cidade perdida
No meio de minha consciência sem foco.
Antídoto ou mais veneno?
O pior é que no fundo,
Não há escolhas. Apenas para os fortes.
Não é meu caso.
Pois morte não é solução.
Salve os corajosos!
Digo, não os salvem...
Deixem que seus problemas se resolvam,
Da maneira mais simples,
Da forma como querem.
Morte não é minha solução.
Não agora.
Quase num passado,
Ou no futuro.
Escolherei pela vida.
Pela minha. Como há muito não o fazia.
Nada me impedirá de respirar,
A não ser essa asma;
Não farei este sofrimento
Me apagar deste mundo.
Este é meu remédio:
Conformação.
E paro por aqui.
Conformação II
Vagueio em seus lugares
Procurando seu cheiro
Sou um cachorro sem dono.
Guio-me pelo extinto mesmo sabendo
Que nós é extinto.
Desatamos aquele nó,
Mal me restou o pó.
Me entreguei novamente
Ao passado distante
E um improvável futuro.
Mas seguirei meu rumo;
Rio abaixo; Que saudade do Rio!
Da carioca, da Conterrânea.
Encalho mais uma vez
E lá se vai uma noite de sono.
Lerei isso com rancor?
Que saudade do Rio,
O lugar comum que me esvaziava o coração.
Até o fim destas notas
Lembrarei de não escrever
A terceira Conformação.
Pois até lá estarei mais forte
Sem ela, sem ninguém.
Solidão é dois gumes de uma faca enferrujada
A liberdade e a segurança.
Ai! Que saudade do Rio.
terça-feira, 27 de abril de 2010
Alinhem-se, julguem....
Conformação I
Finalmente tudo volta ao seu lugar;
Apenas meu coração desolado
Espera seu perdão calado
Calmo, endurecido e sem lar.
Não farei uma trova por você
Serei responsável pelo o que fiz
Brindarei ao dono do nariz
Que de você se lembra pra esquecer.
Sei do meu erro, meu bem.
Não sinta dó,
Só me deixe só,
Não negue ninguém,
Não me ligue, por favor.
Senão, trago-lhe uma flor...
E daí te quero,
Desejo,
Me perco em tuas curvas, teu rosto, teu riso e cabelo.
E tudo recomeça.
Cem anos de carinho no braço.
É o que pago!
segunda-feira, 19 de abril de 2010
Pega essa!
A saudade que eu queria*
As lembranças deveriam ser só lembranças.
Mas elas têm uma outra ligação com os homens.
São carregadas de melancolia,
Enquanto deveriam ser maníacas.
Em muitos ela é causa de depressão,
Ou no mínimo, o saudosismo é melancólico.
Transforma os homens em grãos de areia
Inertes em tempestades desérticas.
O saudosismo é a pior sensação
Que nos liga ao passado.
É o freio do presente, âncora do futuro.
Lembrar com saudade
É rasurar o rascunho do amanhã.
O passado deve ser adiado,
Deve ser o livro que nunca deveria ser lido,
Cujo simples desempoeirar nos mostrará
Nosso antigo erro.
Para enfim, criarmos novos.
E a história se repete...
A saudade é terrível,
É a pior sensação do porvir.
sexta-feira, 16 de abril de 2010
Eis que surge o improvável...
A caminhada de Vitale
Não peguei nenhum atalho
Para chegar onde estou
Por isso não cheguei a lugar algum.
Estou no meio da estrada
Esperando uma carona
Enquanto ninguém passa.
Vou caminhando
Sem pressa,
Mas não devagar.
Para os que passam sou suspeito
O lugar algum sempre vem ao meu encontro.
Passo a passo.